Quem precisa saber
escrever?
Marta Medeiros
Recebo e-mails de pessoas com idades e profissões
diversas. Outro dia, chegou a mensagem de um sujeito muito gentil, fazendo
comentários elogiosos à coluna. Cometeu alguns erros gramaticais comuns, como
acontece com meio mundo, mas o que me surpreendeu foi que ele se despediu
dizendo: “Desculpe por não escrever o Português corretamente, mas sabe como é,
sou estrangeiro”. O raciocínio era que se ele fosse escritor, jornalista ou
professor, escrever certo seria obrigatório, mas sendo estrangeiro, estava
liberado dessa fatura. Assim como
ele, inúmeras pessoas acreditam que escrever não está na lista das cem coisas
que se deva aprender a fazer direito na vida. Antes de aprender a escrever bem,
esforçam-se em aprender a falar inglês fluente, a jogar golfe e a utilizar o
hashi num restaurante japonês. Escrever bem? Não parece tão necessário, já que
a gente acaba sendo compreendido igual. “Espero não lhe incomodar com esse
e-mail, é que faço jornalismo e queria umas dicas”. O recado foi dado. É
preciso dizer que não há ninguém que seja imune a erros. Todo mundo se engana,
todo mundo tem dúvidas. Não conheço um único escritor que não trabalhe com um
dicionário ao lado. De minha parte, sempre tenho uma consulta a fazer no
Aurélio, nunca estou 100% segura, e mesmo tomando todos os cuidados, erro.
Acidentes acontecem, o que não pode acontecer é a gente se lixar para a
aparência das nossas palavras. Escrever bem - não estou falando de escrever com
estilo, talento, criatividade, apenas de escrever certo - deveria ser
considerado um hábito tão fundamental quanto tomar banho ou escovar os dentes.
Um texto limpo também faz parte da higiene. Bilhetes, e-mails, cartões de
agradecimentos, tudo isso diz quem a gente é. Se você não sai de casa com um
botão faltando na camisa, por que acharia natural escrever uma carta com as
letras fora do lugar? Sábado, 23 de abril, é o dia Mundial do Livro, data
instituída pela Unesco. Sei que todos estão carecas de saber a importância da
leitura na vida de uma pessoa, mas não custa lembrar que, quem não lê, corre
muito mais riscos de dar vexame por escrito, e isso não é algo a ser considerado
só porque se trabalha numa profissão que, aparentemente, não exige
familiaridade com as palavras. Ninguém precisa ser expert, mas ser cuidadoso
não mata ninguém. Meu irmão, outro dia, me escreveu um e-mail rápido para
recomendar um disco e nunca vi meia dúzia de frases tão bem colocadas. Nem
parecia um engenheiro. (Jornal Zero Hora, Caderno Donna, 24 de abril de 2005)
Comentário Jussara: Em tempo de Bienal do Livro, achei interessante reproduzir
essa crônica em meu site - de uma de nossas melhores escritoras gaúchas.
Concordo plenamente com ela.
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